25 de setembro de 2013

Raio X da Obra: Cão Come Cão



Classifico o Romance de Ed Bunker como uma arte física, verossímil. Quem o ler vai se deleitar num mundo palpável de fortes emoções. Pra quem vive num gueto, os personagens podem parecer com antigos conhecidos, comuns ao tipo de vida aventureiro e de caráter muito bem definido. A história avança em 1995, abordando a trajetória de 3 personagens principais. Troy - o protagonista - um ex-condenado, arquétipo do autor, branco, criminoso. Teve, como os outros dois, passagens por instituições de menores e delegacias, cumprindo pequenas penas, e ao mesmo tempo, apaixonado e compulsivo por livros, graduando-se na cadeia. Faz o estilo autodidata marginal. Seus amigos de infância, Diesel e Mad Dog, igualmente perdidos na filosofia do crime, seguem no mesmo passo, almejando um lugar ao sol.
Num clima colérico, desde o estranho convívio com negros, na rotina de um abrigo para menores na Roosevelt, os três se sentem a vontade para opinar, do modo como aprenderam, sobre as diferenças de postura entre negros e crioulos - Niggers: uma conotação pejorativa para aqueles que aqui, no Brasil, são conhecidos como bandidos sem responsabilidade: os que tiram uma vida pelo simples fato do assaltado em questão não portar dinheiro na carteira. A trama, então, passa a ser contata na vida adulta. Troy ganha sua liberdade após cumprir pena na Prisão Estadual de San Quentin. Ele rapidamente, sem pestanejar, se reinicia na vida do crime. Os dois comparsas, também livres, são novamente convocados para uma parceria fora da lei. Diesel, branco, auto, forte, ex-pugilista de cadeia, a quem Troy tem maior afinidade, é facilmente restituído. O outro, Mad Dog, também branco, criminoso sem escrúpulos, viciado em heroína, com fama de louco, mas a quem Troy deve a sua vida, uma vez protegida no reformatório anos atrás, numa briga entre menores internos, também entra na aliança. Os golpes da quadrilha, no início, ganham sucesso. Mas Mad Dog ameaça a saúde dos negócios por se relacionar mal com Diesel e causar insegurança em todos pelos excessos que comete. Diesel descobre que Mad Dog matou uma moça - a ex-namorada -, e sua pequena filha, após uma visita a Mad Dog, num momento isolado num cômodo da casa, onde achou os corpos conservados no refrigerador. Desde então, depois que Troy é comunicado, a dupla passa a se sentir ainda mais desconfortável. Troy - o cabeça do bando - e Diesel passam a conversar e pensar melhor no futuro de Mad Dog. Diesel não o suporta e  por saber de suas insanidades o teme secretamente. Eles já discutiram uma vez pela insatisfação na partilha de um dinheiro, numa velha "fita", e portanto carregavam também uma ponta de ódio, um contra o outro.
O plano carro chefe da trama é posto em pauta, Bunker narra com propriedade deixando a impressão de um relato empírico. Os três, camuflados numa viatura policial, vestidos à caráter, possuindo o dossiê da vítima, rastreiam o mesmo para assaltá-lo. Trata-se de um traficante bem sucedido, ambientado no assombroso submundo de Los Angeles - West Coast. A investida é proposital, busca a eliminação de qualquer chance de denúncia a polícia. Mas eles não param por aí. Troy visita um amigo numa prisão no México e é encarregado de sequestrar um bebê. Missão aparentemente fácil, mas no desenrolar eis que surge o carma: Mad Dog, na tentativa de salvar Troy, dispara um tiro fatal contra um homem disfarçado dentro da casa do bebê, depois se descobre que esse era o pai da criança, o idealizado como pagante do resgate, que por uma fatalidade, estava no momento do sequestro. Um deslize.
Com isso, na dor de um dilema, Troy sentencia uma decisão difícil à tempos. Com uma automática apontada para a nuca de Mad Dog - que por um momento se distraia -, ele pesou os motivos para matar ou deixa-lo com vida, e disparou na cabeça dele.
Nesse universo, o leitor percebe do que se submete aquele a quem depende do crime, onde a ética é desafiada por opiniões sensatas, naturais sopros de sobrevivência. A lealdade é analisada como produtiva ou destrutiva, desembocando numa realidade amarga. 
 No decorrer, Diesel, precariamente suspeito pelas tatuagens, é perseguido pela polícia, inicia um tiroteio na saída de um mercado e acaba brutalmente assassinado. Troy, juntamente é enquadrado, espancado, preso, foge de um hospital a qual estava algemado sob os cuidados médicos da justiça, e perambula solitário pela liberdade, correndo numa rodovia movimentada, num carro roubado, em desespero por se safar.
Bunker passa nas últimas páginas do seu "romance de assaltos", que a vivência criminal é extremamente perigosa, a vida se resume a duras incertezas e penosas surpresas. Minha pessoa, compadecida pelo carisma de Troy, torcia para um final feliz, mas se chocou com um comentário cruel de um policial, que depois de capturá-lo, bastante ferido, dispara uma promessa a queima roupa ao companheiro, prometendo jogá-lo na câmara de gás. Eu percebi tardiamente que torcia por uma fuga, uma chance fundamental de redenção, mesmo não assumindo nenhum traço de arrependimento em Troy. Fui sorrateiramente inserido no grupo, reflexo da convivência estreita com o talentoso narrador. Como um membro entrosado com a gangue, senti que não cumpri a minha parte, deixando a desejar em algum amparo.

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